No último dia 23 de agosto, o escritor e dramaturgo pernambucano Nelson Falcão Rodrigues completaria 100 anos. Autor de 17 peças teatrais, sete romances, cinco contos e diversas crônicas, Nelson era o quinto dos quatorze filhos do casal formado pelo deputado e jornalista Mário Rodrigues e Maria Esther Falcão. O escritor conheceu em vida o aplauso e o esquecimento e, ao ser reabilitado há cerca de 20 anos, acabou por se tornar uma unanimidade nacional, uma das coisas que ele mais temia.
Torcedor fervoroso do fluminense, Nelson ficou famoso por suas crônicas esportivas e por suas célebres frases. "Em futebol, o pior cego é o que só vê a bola. A mais sórdida pelada é de uma complexidade shakespeariana. Às vezes, em um córner bem ou mal batido, há um toque evidentíssimo do sobrenatural", disse certa vez o cronista responsável pela popularidade do Fla-Flu.
Nelson Rodrigues com a camisa do time do coração.
Sua entrada no teatro, melhor dizendo seu nascimento como dramaturgo, aconteceu em um momento de dificuldades financeiras, quando escreveu sua primeira peça, A mulher sem pecado, em 1941. O estilo realista com fortes doses de erotismo ficou logo evidente em sua obra. A crítica à sociedade e as suas instituições, principalmente ao casamento fazem parte de toda a obra de Nelson, que foi comparado ao também escritor realista Eça de Queirós.
Algum tempo depois, escreveu uma das suas mais famosas peças, Vestido de noiva, que se tornou um enorme sucesso, tornando-se um marco do moderno teatro brasileiro.
Algum tempo depois, escreveu uma das suas mais famosas peças, Vestido de noiva, que se tornou um enorme sucesso, tornando-se um marco do moderno teatro brasileiro.
Vida marcada pela tragédia
Nelson veio com a família para o Rio de Janeiro em 1916, onde viveu por toda a vida. Seu pai foi trabalhar no jornal Correio da Manhã, mas logo depois, na década de 20, resolveu fundar seu próprio jornal, A Manhã. Foi nesse jornal que Nelson iniciou sua carreira jornalística, aos treze anos de idade, na seção de polícia, experiência que lhe deu muita inspiração para suas futuras histórias. Apesar da situação financeira confortável na época, seu pai perdeu o controle acionário do jornal, mas, em 1928, fundou o diário A Crítica, que se tornou um sucesso de vendas mesclando uma cobertura política apaixonada com o relato sensacionalista dos crimes. Uma das notícias de capa causou uma tragédia na família. A notícia relatava a separação do casal Sylvia Serafim e João Thibau Jr. A esposa indignada entrou na redação do jornal armada e atirou em Roberto, irmão do escritor. O pai, Mário Rodrigues, deprimido com a morte do filho faleceu meses depois. Com a Revolução de 30, o jornal é fechado e a família mergulha em uma crise financeira, que durou anos.
Em 1932, Nelson foi efetivado como repórter do Jornal O Globo e, pouco tempo depois, descobriu que estava com tuberculose. Passou um longo período em um sanatório de Campos do Jordão e o seu tratamento foi custeado por Roberto Marinho, dono do jornal, por quem Nelson ficou grato por toda a sua vida. Recuperado, retornou ao jornal e assumiu a seção cultural.
Em 1945, Nelson passou a trabalhar nos Diários Associados, de Assis Chateaubriand, quando escreveu seu primeiro folhetim, Meu destino é pecar, que alavancou as vendas de O Jornal, o que estimulou o escritor a escrever sua terceira peça, Álbum de família.
Em 1950, passou a trabalhar no jornal de Samuel Wainer, Última Hora e lá começou a escrever um de seus maiores sucessos jornalísticos, as crônicas de A vida como ela é, atualmente apresentadas no programa dominical Fantástico, da TV Globo, onde Nelson começou a trabalhar na década de 60, participando da primeira "mesa-redonda" sobre futebol da televisão brasileira, o programa Grande Resenha Esportiva.
Saúde debilitada
A partir dos anos 70, Nelson viu sua saúde começar a decair. Fumante inveterado, o escritor descobriu-se portador de problemas gatroenteorológicos e cardíacos.
No dia 21 de dezembro de 1980, em uma manhã de domingo, aos 68 anos de idade, falecia o polêmico escritor, após sete paradas cardíacas. Nesse mesmo dia, Nelson acertou os treze pontos da loteria esportiva em um bolão com alguns amigos do jornal O Globo.
Para finalizar esta homenagem, nada melhor do que uma definição do escritor, elaborada pelo próprio Nelson: "Sou um menino que vê o amor pelo buraco da fechadura. Nunca fui outra coisa. Nasci menino, hei de morrer menino. E o buraco da fechadura é, realmente, a minha ótica de ficcionista. Sou (e sempre fui) um anjo pornográfico (desde menino).