Mais uma vez venho aqui para falar sobre a novela das 18 horas da TV Globo,
Lado a lado. Ela está em sua reta final e vai deixar saudade. Não é uma saudade sofrida e chorosa de quem deseja que a novela nunca mais saia do ar, tornando esse folhetim de sucesso uma história arrastada. Não, não é isso. É uma saudade gostosa, aquela quando vivenciamos algo bom e gostamos de ficar lembrando. Sim, acho que é isso.
A novela começou timidamente, após o sucesso da anterior e foi conquistando seu espaço aos poucos ao mostrar os encontros e desencontros dos dois casais de protagonistas, Laura e Edgar (Marjorie Estiano / Thiago Fragoso) e Isabel e Zé Maria (Camila Pitanga / Lázaro Ramos), como qualquer bom folhetim. Mas a novela mostrou muito mais que isso. Mostrou um período da história do Brasil em que não estamos acostumados a ver em novelas de época, o período após a abolição da escravidão. Isso foi um diferencial e tanto, ao menos na minha opinião. Tivemos a oportunidade de ver as dificuldades enfrentadas pelos negros recém libertos, abandonados pelas autoridades e vítimas do enorme preconceito da classe dominante e da população branca e pobre em geral, que também não aceitava o negro como parte do povo brasileiro, salvo raras e poucas exceções.
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Marjorie Estiano e Thiago Fragoso como Laura e Edgar. |
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Lázaro Ramos e Camila Pitanga como Zé Maria e Isabel. |
A situação da mulher no início do século foi outro ponto forte abordado pela trama de João Ximenes Braga e Claudia Lage. Igualmente vítimas de preconceitos inimagináveis, as mulheres do início do século XX sofreram muito para abrir os caminhos para as gerações futuras em uma sociedade machista e preconceituosa. Hoje, sequer lembramos que há muito pouco tempo atrás, as mulheres não podiam votar! Através da personagem Laura vivenciamos as dificuldades das mulheres que queriam algo mais, além de cozinhar e cuidar da casa e do marido. A personagem sempre envolvida com os livros, luta para poder trabalhar no que gosta: dar aulas e, ao longo da trama, descobre sua paixão pelo jornalismo. E é nessa hora, que vemos a realidade vivida por várias mulheres naquele período. Muitas assinavam suas matérias com pseudônimos masculinos para que fossem publicadas. Outras chegaram a ser internadas como loucas em sanatórios por ousarem ir contra a ordem vigente, onde só o homem tinha direitos. Ao olharmos para trás, percebemos o quanto a sociedade evoluiu e o quanto já foi conquistado em vários segmentos.
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Laura (Marjorie Estiano) sofrendo no sanatório, onde foi internada pela própria mãe. |
Entre outros acontecimentos históricos, tivemos a oportunidade de vivenciar a chegada da luz elétrica, a expansão da telefonia, o crescimento e a formação das favelas nas partes altas da cidade, os morros, principalmente com os negros que lutaram na guerra de Canudos e os que foram expulsos dos cortiços da antiga Avenida Central, hoje Avenida Rio Branco. Vimos a revolta da chibata. Vimos também o descaso das autoridades com a população mais pobre através do episódio da revolta da vacina. Vimos o nascimento do futebol, inicialmente como esporte da elite, importado dos ingleses, o nascimento do samba e da cultura afrobrasileira, a prática da capoeira, enfim, tantos assuntos interessantes. Como disse em postagens anteriores,
Lado a Lado foi uma novela que inspirava uma vontade de conhecer melhor a nossa história, de pesquisar, de discutir... Disse isso, quando fiz a postagem sobre as
bebidas geladas em 1904 e a outra sobre o
divórcio também em 1904. Lembram?
A trilha sonora também foi muito boa! Ouvi algumas críticas negativas para a diversidade de estilos, mas em minha modesta opinião, achei que as músicas se encaixaram perfeitamente com a narrativa e com os personagens. Quem discordar, pode se manifestar, o espaço é livre e, ao contrário da sociedade do início do século passado retratada na novela, hoje em dia a manifestação das opiniões é permitida para todos.
O elenco também foi de primeira! Patrícia Pillar, como a amoral e reacionária Constância brilhou por toda a trama. A invejosa Berenice, personagem de Sheron Menezes, também impecável. Caio Blat como o irmão bastardo de Edgar, outra atuação incrível. Cássio Gabus como o político e empresário corrupto Bonifácio. Mas não foram só os malvados que se destacaram. Milton Gonçalves brilhou na pele do ex-escravo Afonso. Impossível esquecer a cena em que o seu personagem pede perdão a filha Isabel no palco do teatro. Até aquele momento ele não havia perdoado a filha por ter engravidado antes do casamento e, principalmente, de um homem rico e fútil, que a enganou. Foi uma cena emocionante! Ambos pareciam mesmo estar sofrendo tanto. O herói José Maria dos Santos, o Zé Navalha, o barbeiro capoeira, que se torna administrador após a experiência na Marinha brasileira. De um jeito simples, Lázaro Ramos conseguiu mostrar através da integridade de seu personagem quem são os verdadeiros líderes e heróis. E não podemos deixar de mencionar aqui o casal Laura e Edgar, um sucesso. O casal tem até torcida nas redes sociais. O movimento se chama
Laured e na página do
Facebook podíamos saber as opiniões e as próximas emoções a serem vividas pelos personagens. Marjorie Estiano brilhou como a feminista e batalhadora Laura, sempre apoiada de perto pelo eterno apaixonado Edgar. Enfim, um elenco incrível! Me perdoem se esqueci de mencionar alguém, mas todos estão muito bem em seus papéis.
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Patrícia Pillar como a amoral Constância Assunção. |
A novela está chegando ao fim e não vamos ter tempo de ver resolvidas algumas questões como a da capoeira, para saber quando ela deixou de ser sinônimo de vadiagem e atividade só de negros. Talvez, também não iremos ver a popularização do futebol. Mas a sementinha já foi plantada e mostrada através do personagem Chico (César Mello), o capoeira e ex-marinheiro que se apaixona pelo futebol. Vai ter que ficar para uma nova oportunidade. Quem sabe...
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César Mello, como Chico, que aceita se cobrir de pó de arroz para poder jogar futebol com os brancos. |
Um último ponto que gostaria de destacar foi a dança de Isabel (Camila Pitanga). Na página da
Globo, o coreógrafo Zebrinha conta que o show de Isabel não é um retrato fiel da dança naquela época, até porque não há um registro oficial. Bem, de qualquer forma, quando visitava a exposição sobre animação no CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil), no Rio de Janeiro, assisti um filme 35mm dos irmãos Lumière, com duração de 45 segundos, chamado
Dança Serpentina (
II), de 1897, onde a personagem dança de uma forma que imediatamente me lembrou o show de Isabel em
Lado a Lado. Os movimentos, o figurino, enfim, muito parecido. Acho que vale a pena conferir, pois a semelhança é incrível!
Bem, meus caros amigos leitores, essas foram minhas impressões sobre uma novela que conseguiu ser romântica, emocionante e didática ao mesmo tempo. Meus parabéns aos autores, diretores, atores e a toda equipe de produção. Que venham mais novelas como essa.
EM QUE PESE NÃO TENHA ASSISTIDO À NOVELA, DELA TENHO POUCO CONHECIMENTO PELO MEU IRMÃO. ADOREI, FÁTIMA, SUA EXPOSIÇÃO SOBRE OS FATOS HISTÓRICOS DE QUE ELA TRATOU. ALIÁS, VEM BEM A CALHAR, PELA PROXIMIDADE DO " DIA INTERNACIONAL DA MULHER ". AMIGA, UM ABRAÇO BEM GOSTOSO, PAZ E LUZ ! BEIJOCAS DA TEREZA
ResponderExcluirImpecável! Este o adjetivo que posso mencionar ao ler o texto a respeito de LADO A LADO A RETA FINAL. Com certeza, você conseguiu colocar com suas palavras toda a emoção dos personagens que acompanhamos durante a trama e à nossa satisfação por ter recebido essa aula de história do Brasil. LADO A LADO prova que uma novela pode ser entretenimento, lazer, estudo e cultura, ao mesmo tempo. Obrigado pelo emocionante e merecido resumo deste excelente e maravilhoso trabalho de profissionais dedicados e merecedores de todos os elogios. Parabéns!
ResponderExcluirCosme Luiz Deolindo.
Fátima, Eu vi poucos capítulos dessa novela, mas é impressionante como você consegue abordar vários assuntos com um texto simples e gostoso de ler. Parabéns! WP
ResponderExcluirQuerida mãe, você é incrível! Cada vez que você escreve mais me surpreende. Gostei muito do último texto LADO A LADO NA RETA FINAL! Você mais uma vez me surpreendeu. BJS, João Pedro, seu filho.
ResponderExcluirNão pude ver a novela como gostaria, porém os pedacinhos que via me interessavam muito. Seja por contar a história desta cidade que tanto amo, ou pelas maldades da Constância. O post ficou muito legal !
ResponderExcluirBjs
Minha querida irmã, você como sempre é demais! Adorei seu comentário! Você é o máximo! Achei a novela sensacional também, pois trata de uma parte da nossa história que muitos desconhecem. Beijos da sua irmã que te ama e que te admira muito, Ana.
ResponderExcluirTexto impecável, como era de se esperar, já que estamos falando da Sra. Fátima Augusta.
ResponderExcluirEu sou suspeita para falar dessa novela, pois assim como a Fátima eu era completamente apaixonada por esse folhetim, tal como qualquer história ou conto que nos remetam ao passado e, no meu caso, quanto mais longínquo for o passado melhor.
Tivemos alguns embates em relação à trilha sonora da novela, pois em minha opinião os responsáveis pela sonoplastia poderiam ter optado por + músicas de época, mas aos poucos meus ouvidos foram se acostumando com a trilha e ao final da trama eu já estava gostando de 90% dela, exceto Hip Hop. Embora, eu tenha que admitir eu a heterogeneidade das músicas tenha dado um tempero a mais à novela.
Ah, que coisa linda ouvir a canção "O mundo é um Moinho" a qual Beth Carvalho interpretou fabulosamente a música composta por Cartola em 1970. Era desse tipo de canção que me referia...
A novela vai deixar saudades e agora, só nos resta esperar que a Rede Globo tenha compaixão de nós, pobres amantes de contos do passado, e coloque no ar outra trama tão marcante como esta.
Bj grande. Luciene
Como sempre Fafá arrebentando nos seus comentários, realmente essa novela foi muito boa, que conseguiu ser romântica, emocionante e didática ao mesmo tempo. Bjs. Sonia Guerra.
ResponderExcluirRealmente "Lado a lado" mereceu o prêmio, por todos os motivos exposto em seu relato maravilhoso! Adorei relembrar tantos fatos e acontecimentos importantes, da nossa história! Parabéns, bjus
ResponderExcluirRealmente "Lado a lado" mereceu o prêmio, por todos os motivos exposto em seu relato maravilhoso! Adorei relembrar tantos fatos e acontecimentos importantes, da nossa história! Parabéns, bjus
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